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O efeito Carrie Bradshaw

  • Foto do escritor: Fernanda Russomano
    Fernanda Russomano
  • 24 de ago. de 2024
  • 7 min de leitura

Atualizado: 28 de ago. de 2024

Uma análise do impacto do guarda-roupa de Carrie Bradshaw nas tendências de moda.


Sarah Jessica Parker como Carrie Bradshaw em "Sex and the City." Foto: Everett Collection

Quem não adora um look mismatched e com personalidade hoje em dia? Seja mesclando estampas, estilos, texturas, cores ou até mesmo estações, combinar peças que aparentemente não combinam entre si é o que faz um outfit interessante e único atualmente. Uma camiseta polo listrada combinada com uma saia de estampa de oncinha e um tênis esportivo seria o terror da maioria das millennials em 2010, mas se você tem usado o TikTok ao longo dos últimos meses, deve ter se deparado com tendências como o estilo das “Portuguese Girlies” ou botas de cowboy usadas com roupas nem um pouco Western. É inegável, a mentalidade atual durante o processo de se vestir é: quanto menos combinar, melhor.

Esse conceito de combinar peças aparentemente incompatíveis tem raízes profundas na moda e é algo que Carrie Bradshaw, a protagonista de “Sex and the City”, exemplificou como ninguém. Quando se fala em moda nos anos 90 e 2000 é difícil não pensar no fenômeno de audiência que foi a série da HBO. O que é mais icônico do que a história de quatro amigas vivendo fabulosamente em Nova Iorque por mais de duas décadas? A glamurosa e excêntrica Samantha Jones e o sonhado guarda-roupa de Carrie Bradshaw. Por mais que Samantha tenha influenciado diversas mulheres com sua confiança e atitude, o figurino de Carrie é tão icônico que lançou tendências que ainda reverberam nos dias de hoje. Conhecida por seus looks ousados e com personalidade, o estilo de Carrie não só impactou a moda da época, mas continua a inspirar novos estilos e abordagens, com muitos dizendo até que ela pode ter sido a “influenciadora original”.


“Depois de assistir Sex and the City, eu pensei ‘Nossa, eu posso totalmente criar camadas com quantas peças eu quiser e transformar um top tubinho em uma saia.’ [...] Eu definitivamente tirei inspirações da personagem.”  - Rachel Bilson, estrela de “The OC”, em entrevista para a People TV.


Enquanto millennials tiveram fortes tendências inspiradas pela série - como layering, uso de gravatas e o popular colar com o próprio nome como pingente -, a mentalidade da geração como um todo persistia no foco em ter um “guarda-roupa coringa” com peças básicas e composições convencionais. Desde reality shows como “Esquadrão da Moda” e  diversos vídeos no Youtube com títulos como “Peças chaves que todo guarda-roupa deveria ter”,  até inúmeros livros populares intitulados “guias de estilo”, era ensinado que deveria-se ter um vestido preto básico, uma boa camiseta branca, um blazer preto e um bom par de jeans. Parece que nessa era da moda todos buscavam o mesmo: um guia de moda com regras de estilo para seguir à risca e ir fazendo ajustes sutis conforme as tendências iam surgindo.

Ainda que as dicas transmitidas pelos “guias de estilo” tão amados pelas millennials na época ainda sejam relevantes, atualmente a geração Z - e millennials convertidos - priorizam comprar peças que “estão em alta” do que peças básicas. A vontade de construir um “guarda-roupa coringa” não é mais o que motiva os compradores atuais, mas sim, seguir uma tendência e se vestir de forma mais personalizada. Não muito tempo atrás, acompanhar as novidades e interpretações mais progressistas de moda era um processo mais lento e convencional. Essas tendências surgiam gradualmente, vistas apenas em semanas de moda, revistas e séries de TV como “Sex and the City”. Embora a série já oferecesse uma visão mais disruptiva da moda, foram as redes sociais como Pinterest, Instagram e TikTok que tornaram o acesso a essas tendências não só mais fácil, mas também quase instantâneo.

Na era atual do TikTok quem dita as tendências são os influenciadores, criando novas modas de forma tão rápida que nem mesmo marcas e consumidores conseguem acompanhar. Tão rápido quanto algo entra na moda, algo pode sair, e isso faz com que as tendências tenham um ciclo curto de vida. Como todos têm acesso às tendências com facilidade, todos acabam usando as mesmas coisas e, consequentemente, isso leva a uma rápida perda de interesse. Hoje em dia parece que se algo está “na moda” no TikTok, com certeza pode ser visto facilmente nas ruas. Por exemplo, um amigo meu que mora nos Estados Unidos foi a uma feira recentemente e compartilhou que só via “mulheres com slicked-back buns” e pessoas que, assim como ele, “estavam usando longas meias brancas com loafers pretos e lenço amarrado por cima do boné” e isso o fez perceber que ele não é “tão original como pensava”. Por mais que essas novas tendências venham e sumam de forma acelerada, todas elas têm em comum a vontade de se diferenciar através das roupas e evidenciar o conhecimento das tendências do momento.



Algumas tendências atuais vão em direta oposição à antiga abordagem dos millennials. Segundo Remy Tumin para o The New York Times, “A Geração Z está nos informando que nossas escolhas em meias, cortes de camisa, cores neutras e até mesmo comprar coisas novas ao invés de usadas são cansativas, desatualizadas - e às vezes até ofensivas.” Enquanto os millennials se concentravam em construir um “guarda-roupa coringa”, a Geração Z está desafiando essas convenções. Com o avanço das redes sociais, surgiu uma nova mentalidade que rejeita regras rígidas, valoriza a criatividade e a individualidade, e se preocupa com o impacto que o consumo exagerado tem sobre nosso planeta.

Sendo conhecida por ser mais consciente ambientalmente do que as gerações anteriores, a Geração Z tem cada vez mais priorizado ir a lojas de segunda-mão do que a lojas de fast fashion - extremamente populares nos anos 90 e 2000. Segundo relatórios de análise de consumo da Statista, dados de 2023 revelaram que além do aspecto da sustentabilidade, consumidores jovens também priorizam comprar itens usados pelo custo mais acessível e estimam que até 2026 o valor global do mercado de vestuário de segunda-mão e revenda aumente 100 bilhões de dólares em relação à 2023. Além de ser mais sustentável e acessível financeiramente, comprar em brechós permite encontrar peças únicas e com mais personalidade do que as vendidas em lojas de “moda rápida” como Zara ou H&M. Um exemplo é a popularidade de peças vintage, como jaquetas de couro e jeans dos anos 80, blazer com ombreiras grandes, cardigans de tricô texturizados ou sapatos de couro com bico fino.



Ao acompanhar qualquer influencer atual, parece que as peças mais bonitas de seu closet são aquelas “que quase ninguém tem”, podendo ser peças vintage ou acessórios de marcas de luxo que se tornaram virais - como a controversa bolsa pombo de JW Anderson, usada por Carrie no recente reboot de SATC*, “And Just Like That”. O objetivo é sempre dar um toque de originalidade, e não é à toa que uma das tendências do momento é decorar bolsas com chaveiros da Hello Kitty, laços de renda ou correntes de miçangas coloridas. Com tantas tendências novas surgindo a cada dia, a geração Z quer se divertir com as roupas e acessórios que usa, mesclando tendências com um twist pessoal, e isso reflete tudo que Carrie Bradshaw representa.

O “Efeito Carrie Bradshaw” é justamente o resultado mismatched da mescla de todas essas tendências com elementos que refletem aspectos de personalidade. A Carrie é conhecida por seus looks que fogem do convencional, por misturar padrões, usar várias camadas, usar tutus de bailarina em qualquer ocasião e mesclar peças caras (como seus inúmeros pares de sapatos Manolo Blahnik) com outras peças casuais (como regatas e leggings). Quem não lembra da icônica cena em que ela diz “No dia seguinte, eu estava procurando um vestido de $7 dólares para usar com meu sapato de $300? Essas características de quebrar convenções de moda e assumir seu estilo pessoal são essencialmente Carrie e, 26 anos depois da estreia da série, segue influenciando a moda atual. Segundo a Vogue Austrália, “algumas coisas são comprovadamente eternas e o guarda-roupa de Carrie Bradshaw conta como uma dessas coisas.” 


Sarah Jessica Parker como Carrie Bradshaw em "Sex and the City" Fotos: Getty Images; New Line Cinema

Para quem é - e sempre foi - do meio da moda, essa abordagem para com a moda faz parte do DNA ou reflete anos acompanhando desfiles de moda desde o ready-to-wear à alta costura - podendo também ter referências de SATC. Porém, para a maior parte da população global a personagem, interpretada por Sarah Jessica Parker, influenciou mais pessoas a não terem medo de explorar e brincar com a moda e com as tendências e fugir das regras de vestuário estabelecidas pelas gerações anteriores. Não é à toa que após mais de duas décadas de sua estreia, a série continua sendo relevante e ganhando novos telespectadores a cada dia que passa, ganhando seu reboot em 2021 intitulado And Just Like That. Além disso, não é incomum estar rolando o feed do TiktTok e dar de cara com alguém recriando a cena icônica da série em que Carrie Bradshaw é assaltada e perde seu par de Manolo Blahnik - um meme que até ganhou versões brasileiras comparando Manolos à Havaianas.

Carrie foi e sempre será um ícone da moda. O impacto do "efeito Carrie Bradshaw" é visível não apenas no aumento das vendas de marcas icônicas, como Manolo Blahnik - que teve seus lucros triplicados depois da estreia do reboot -, mas também na forma como a moda evoluiu e continua se adaptando à medida que o tempo passa. A série e a personagem de Sarah Jessica Parker continuam a inspirar novos públicos, mostrando que, mesmo em um mundo onde as tendências mudam rapidamente, a criatividade e a individualidade na moda permanecem atemporais. Com mais de 94 episódios da série, dois filmes e uma série de continuação, ainda temos muitos looks de Carrie para nos inspirar - e ficamos no aguardo para ver os que ainda virão.




*SATC = Abreviação de "Sex and The City."


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